Comportamento
| N° Edição: 2223
| 15.Jun.12 - 21:00
| Atualizado em 16.Jun.12 - 08:44
Raptadas pelos pais
O drama das crianças que estão no centro de disputas internacionais, por terem sido levadas para o exterior pelo pai ou pela mãe, e não podem voltar para casa
Wilson Aquino
mas o pai conseguiu repatriar a menina para a Alemanha
As disputas internacionais cresceram muito. O número de crianças
mandadas para o exterior subiu nove vezes entre 2002 e 2011 e o de
menores devolvidos aumentou quatro vezes no mesmo período, segundo dados
da Secretaria Nacional dos Direitos Humanos. Nos últimos nove anos, 129
menores foram repatriados ao Brasil e 359 foram enviados para o
exterior. O caso mais rumoroso foi o do menino Sean Goldman, devolvido
ao pai americano em 2009 (leia na pág. 62). Todas as histórias envolvem
dor, sofrimento e perdas, pois são famílias desfeitas de forma
traumática – em geral o pai ou a mãe viaja para o Brasil ou para o
exterior com o filho e decide não mais voltar –, a criança fica no
centro de uma briga sangrenta e, sobretudo, privada do convívio com um
dos pais.
Juristas brasileiros elogiam o pacto de Haia, mas não sua aplicação no País. “A Convenção é sábia, o problema é a forma como vem sendo empregada”, diz o coordenador da Assessoria Internacional da Defensoria Pública da União, Afonso Carlos Roberto do Prado. Exemplo disso, segundo ele, é o caso da baiana Adriana Botelho, 32 anos, que estava no trabalho, em dezembro, quando recebeu um telefonema aflito da mãe: “Venha correndo que tem dois policiais federais e um oficial de justiça dizendo que vão levar a Maria Clara.” A menina, de 6 anos, é filha de Adriana com o produtor cultural português José Eurico Rodrigues Santana. Eles se conheceram em 2003 e foram morar em Portugal. Cinco anos depois se separaram, Adriana veio de férias ao Brasil e decidiu não retornar para Portugal com Maria Clara. Santana deu queixa à Autoridade Central portuguesa, que cobrou providências à correspondente brasileira, exigindo a repatriação da criança.
Juristas brasileiros elogiam o pacto de Haia, mas não sua aplicação no País. “A Convenção é sábia, o problema é a forma como vem sendo empregada”, diz o coordenador da Assessoria Internacional da Defensoria Pública da União, Afonso Carlos Roberto do Prado. Exemplo disso, segundo ele, é o caso da baiana Adriana Botelho, 32 anos, que estava no trabalho, em dezembro, quando recebeu um telefonema aflito da mãe: “Venha correndo que tem dois policiais federais e um oficial de justiça dizendo que vão levar a Maria Clara.” A menina, de 6 anos, é filha de Adriana com o produtor cultural português José Eurico Rodrigues Santana. Eles se conheceram em 2003 e foram morar em Portugal. Cinco anos depois se separaram, Adriana veio de férias ao Brasil e decidiu não retornar para Portugal com Maria Clara. Santana deu queixa à Autoridade Central portuguesa, que cobrou providências à correspondente brasileira, exigindo a repatriação da criança.
DISPUTA
A menina Maria Clara, 6 anos, retornou para Portugal a fim
de viver com o pai contra a vontade da mãe, Adriana Botelho
De seu lado, Adriana já havia entrado com ação solicitando a guarda da menina. Os representantes da lei que chegaram à casa dela, porém, estavam munidos de liminar de busca e apreensão da criança, expedida horas antes por uma juíza federal. O episódio aconteceu no fim do ano, na véspera do recesso judiciário. Enquanto a mãe se desesperava no dia seguinte sem saber a quem recorrer, a menina embarcava para Portugal. Adriana nunca mais a viu. “Minha filha agora é órfã de mãe viva”, diz, entre lágrimas. “Avisamos a um desembargador que a menina iria embarcar no dia seguinte e pedimos a liminar, mas quando ele concedeu ela já tinha embarcado”, conta o defensor Prado. “Estão despachando as crianças para o exterior a toque de caixa”, reclama o advogado Luiz Octavio Rocha Miranda, do Instituto Brasileiro de Direito de Família, experiente em processos fundamentados na Convenção de Haia. “Da maneira como está sendo tratada, a Convenção viola a soberania dos tribunais brasileiros”, afirma Rocha Miranda.
Alguns especialistas defendem que é um erro atribuir à Justiça Federal a competência para julgar esse tipo de caso, quando a Justiça Estadual tem Varas especializadas, as de Família. A jurista gaúcha Maria Berenice Dias, especialista em direito de família, é dessa opinião. “A Convenção de Haia diz que a criança tem de ir para o lugar onde ela estava quando o processo é iniciado com menos de um ano da transferência. Não se faz uma avaliação. Eles tratam a criança como se fosse um objeto”, protesta. O critério que prevalece é o da residência habitual. “Pode ser até filho de casal brasileiro, mas se a residência for, por exemplo, nos Estados Unidos, é o juiz americano quem vai decidir”, explica o juiz federal Jorge Antonio Maurique, de Santa Catarina, integrante do órgão da Secretaria Nacional dos Direitos Humanos encarregado da aplicação da Convenção no Brasil. “Porque é onde estão a escola, os amigos, a família, o ambiente da criança.”
Ser protagonista de tamanho drama deixa marcas na criança. “Ela fica com isso guardado. Pode até não ter lembrança, mas tem o registro de uma ocasião em que experimentou uma angústia muito forte”, afirma a psicanalista Ana Maria Iencarelli, especialista em infância e adolescência. “Essas coisas ficam fotografadas como um flash na cabeça da criança. Fica o registro da emoção, do medo, do mal-estar. Isso vai retornar diante de situação parecida”, diz. A menina Elena, 12 anos, que tem síndrome de Down, foi levada da casa da mãe em Brasília por policiais munidos de um mandado de busca e apreensão. “Ela entrou em choque, chorava e gritava”, lembra, aos prantos, a professora Eliana Marz, 47. A disputa pela adolescente começou no ano passado, quando a professora veio para o Brasil e decidiu se separar do marido alemão, Johannes Josef März, 56 anos, que é diretor-veterinário do Estado da Bavária. Ela resolveu não mais voltar para Munique, alegando violência doméstica contra ela e abuso sexual contra a filha. Em solo brasileiro conseguiu a tutela da menina, mas o ex-marido acionou a Convenção de Haia. Na véspera do Natal, a garota foi levada. Mãe e filha se agarraram, mas não resistiram. Eliana nunca mais viu a menina e passou o Dia das Mães acampada na porta da Secretaria Nacional dos Direitos Humanos, em Brasília, segurando um cartaz com a foto de Elena.
http://www.istoe.com.br/reportagens/214431_RAPTADAS+PELOS+PAIS?pathImagens=&path=&actualArea=internalPage
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